Tecnologia do Blogger.
RSS

A CORUJA

A CORUJA

À noite a cidade pulsava em suas sombras. E de suas sombras nasciam
imaginações fantásticas.

O silêncio não era repouso, mas gestação de atos. A cidade era uma
usina humana. A cidade era uma usina de emoções e desejos.

E, no seio da noite nasciam homens, bestas, sexo, riso e choro.

De repente, das entranhas das sombras, um ladrão, depois do assalto,
corria do seu próprio medo.

Também das sombras surgiam mulheres incríveis, recheadas de desejos e
volúpias. Mas, só os poetas e os loucos as viam.

Nas sombras da noite as recatadas, as reprimidas e as eternas ocupadas
podiam, enfim, deixarem fluir seus desejos. Elas se transformavam em
lúdicas insaciáveis.

Elas eram despertadas dentro das garrafas de cerveja, vinho,
aguardente. Os ébrios temiam cair em suas garras e ficarem
prisioneiros da bebida, da abstinência, do amor, do ódio, da
fidelidade e da traição.

Nos bares os ébrios bebiam seus medos. Embriagavam-se com suas
fantasias. Nos bares eles não se encontravam, se perdiam e não
conseguiam mais se libertar das garras encantadoras da noite. Tinham
se tornado mariposas.

Durante o dia os habitantes das sombras permaneciam ocultos,
transparentes. De fato, a claridade não revelava nada. A cidade sabia
se maquiar. Só à noite ela mostrava sua face acolhedora, enfeitando-se
de luzes. A cidade só existia, essencialmente, nas sombras.

A claridade não a desmascarava e, sim, a mascarava. Iluminada, aberta,
acolhedora, quente, risonha. Assim, durante o dia ela se preparava,
disfarçadamente, para estimular nossos desejos, nossos sonhos para o
anoitecer.

Assim que caía a noite havia uma agitação, um frenesi, um medo
latente, um desejo insatisfeito. À noite havia um despertar. Era à
noite que mostrávamos o nosso humor, cansaço, disposição, tesão,
impotência, coragem, covardia, alegria, tristeza, desesperança,
esperança.

Os sonos a invadiam e a agitavam, igualmente como os despertares. Eles
criavam tensões entre os vivos e os mortos da noite. Corriam ruas,
becos, avenidas.

A cidade era a tensão do gatilho prestes a disparar desejos. Na luz
tudo dormia oculto para ser despertado pelas sombras.

Apenas os olhos de uma coruja cravavam a noite como espadas reais,
desnudando-nos a sua verdadeira face.

À noite a cidade era um espelho, pura alma, a revelar-nos.


Hideraldo Montenegro

adquira e leia o livro O ESPELHO DE ALICE acessando:
http://www.simplissimo.com.br/store/featured-authors/o-espelho-de-alice.html

--
Você está recebendo esta mensagem porque se inscreveu no grupo "Dividindo a Vida" dos Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para dividindoavida@googlegroups.com.
Para cancelar a inscrição nesse grupo, envie um e-mail para dividindoavida+unsubscribe@googlegroups.com.
Para obter mais opções, visite esse grupo em http://groups.google.com/group/dividindoavida?hl=pt-BR.

  • Digg
  • Del.icio.us
  • StumbleUpon
  • Reddit
  • RSS

0 comentários:

Postar um comentário